quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. AQUISIÇÃO, LOCAÇÃO E DOAÇÃO DE IMÓVEIS. INCENTIVO À INDÚSTRIA. MÁ-FÉ NÃO CONFIGURADA. IMPROCEDÊNCIA. STJ.


PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LEI 8.429/92. DISPENSA DE LICITAÇÃO. COMPRA E VENDA E DOAÇÃO DE IMÓVEIS REALIZADOS PELO MUNICÍPIO. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO AGENTE PÚBLICO. VIOLAÇÃO DOS VIOLAÇÃO DOS DEVERES DE MORALIDADE E IMPESSOALIDADE. NÃO COMPROVADOS. DANO EFETIVO. AUSÊNCIA. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 07/STJ. VIOLAÇÃO DO ART. 535, I e II, DO CPC. NÃO CONFIGURADA.

1. A compra ou locação de imóvel destinado ao atendimento das finalidades precípuas da administração, cujas necessidades de instalação e localização condicionem a sua escolha, desde que o preço seja compatível com o valor de mercado, segundo avaliação prévia, não carece de licitação , ante a ratio do art. 24 da Lei 8666/93.

2. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento de contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice erigido pela Súmula 07/STJ.

3. Ação Civil Pública ajuizada por Ministério Público Estadual em face de ex-Prefeito, objetivando a anulação de contrato de compra e venda de lotes, localizados no Distrito Industrial da municipalidade, para fins de doação à indústria que quisesse se instalar no Município, com vistas à implementação do programa de incentivo ao desenvolvimento industrial.

4. In casu, a conclusão da Corte de origem de que a dispensa de licitação para a aquisição de terrenos no Distrito Industrial para doação à indústria que quisesse se instalar no Município, com vistas à implementação do programa de incentivo ao desenvolvimento industrial, não ensejou prejuízo ao erário, além do fato de que "(..)a finalidade da doação foi plenamente atendida como se vê dos documentos de f. 333/349, através dos quais se observa que, efetivamente, a indústria foi instalada, está dando retorno de impostos, fornecendo mão-de-obra e, conseqüentemente, fazendo girar mais riquezas no Município com o recebimento de salário de seus empregados(..)"(fl. 740), resultou do exame do contexto fático-probatório engendrado nos autos, o que denota a insindicabilidade do thema pelo STJ, ante o óbice erigido pela Súmula 07 desta Corte.

5. A título de argumento obiter dictum merece destaque as situações fáticas, insindicáveis nesta Corte, assentadas pelo Tribunal local:"(...)O Município de Elói Mendes, interessado em atrair para o seu Distrito Industrial a empresa Souza & Cambos Confecções Ltda., que prometia a geração de 100 novos empregos com a instalação de uma filial, criou, por ato de seu Prefeito - Portaria 0020/97 (f. 88) -, uma comissão especial para aquisição de terreno a ser doado àquela Indústria, que, após concluídos os seus trabalhos, ofereceu o parecer de f. 90, sugerindo a aquisição do imóvel constituído de 9.064 m2, situado no Distrito Industrial e pertencente à firma Transportes Biagini Ltda., avaliado em R$45.320,00, ou R$5,00 o m2, mais benfeitorias avaliadas em R$12.224,00, totalizando o preço de R$57.544,00; pelo parecer de f. 89, verifico que foi instalado processo licitatório para o mister, de nº 054/97, com sugestão de dispensa de licitação, fundamentado no art. 24, X, da Lei 8.666/93;

o Presidente da Comissão de Licitação do Município ofereceu o parecer de f. 91, pela dispensa da licitação, sob o mesmo fundamento, parecer este que foi ratificado pelo Sr. Prefeito Municipal, como se vê a f. 92; o Município fez a aquisição do terreno, como se vê pelo contrato particular de compra e venda de fl. 94, pelo preço certo de R$51.000,00 para pagamento em 3 parcelas de R$17.000,00, sendo certo que a f. 194/197, há notícia de que do preço da venda, R$11.000,00 foram pagos pela donatária, que teria assumido o preço das benfeitorias. A operação está amparada na Lei municipal nº 540, de 29 de julho de 1997 - f. 46/47, que autoriza o Poder Executivo a abrir crédito especial de R$56.000,00 destinado a aquisição de terrenos no Distrito Industrial para doação a indústrias que quisessem se instalar no Município e pela Lei municipal 564, de 04 de dezembro de 1997 - f. 56 -, que autoriza a doação do terreno à Souza & Cambos Confecções Ltda., sob as condições nela previstas. De se observar, ainda, que o terreno doado é composto de 8 lotes da quadra 4, do Distrito Industrial de Elói Mendes, num total de 9.064,49 m2, avaliado pela CDI - Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais a R$5,00 o m2, como se vê a f.

325. Em se considerando que o Município despendeu R$40.000,00 para aquisição do mesmo, uma vez que os R$11.000,00 foram suportados pela donatária - f. 196/197 - ele pagou o m2 a R$4,41, de conseguinte, preço inferior ao da avaliação tanto da comissão constituída pela Portaria 20/97, como pela CDI(..)" fls. 739/740 6. Ad argumentandum tantum, ainda que ultrapassado o óbice erigido pela Súmula 07/STJ, no mérito, melhor sorte não assiste ao recorrente, mormente porque a abalizada doutrina sobre o thema decidendum, especialmente no que pertine à dispensa de licitação, assenta que: "(...)As diferenças entre inexigibilidade e dispensa de licitação são evidentes. Não se trata de questão irrelevante ou meramente retórica, mas de alternativas distintas em sua própria natureza, com regime jurídico diverso.

A inexigibilidade é um conceito logicamente anterior ao da dispensa.

Naquela, a licitação não é instaurada por inviabilidade de competição.Vale dizer, instaurar a licitação em caso de dispensa significaria deixar de obter uma proposta ou obter uma proposta inadequada. Na dispensa, a competição é viável e, teoricamente, a licitação poderia ser promovida. Não o é, diante das circunstâncias, a lei reputa que a licitação poderia conduzir à seleção de solução que não seria a melhor, tendo em vista circunstância peculiares.

Em suma a inexigibilidade é uma imposição da realidade extranormativa, enquanto a dispensa é uma criação legislativa. Como decorrência direta, o elenco de causas de inexigibilidade contido na Lei tem cunho meramente exemplificativo. Já os casos de dispensa são exaustivos, o que não significa afirmar que todos se encontram na Lei n° 8.666. Outras leis existem, prevendo casos de dispensa de licitação.

Como decorrência, a conclusão acerca da caracterização da inexigibilidade faz-se em momento logicamente anterior ao do reconhecimento da dispensa. Num primeiro momento, avalia-se se a competição é ou não é viável. Se não for, caracteriza-se a inexigibilidade. Se houver viabilidade de competição, passa-se à verificação da existência de alguma hipótese de dispensa " Marçal Justen Filho, in Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos, Ed. Dialética, São Paulo, 2005 7. Nada obstante, sobreleva notar, a dispensa de licitação para a compra dos imóveis in foco, sob o pálio da Lei Municipal nº 540, de 29 de julho de 1997, que autoriza o Poder Executivo a abrir crédito especial de R$56.000,00 destinado a aquisição de terrenos no Distrito Industrial para doação a indústrias que quisessem se instalar no Município (fls. 46/47) e da Lei Municipal 564, de 04 de dezembro de 1997, que autoriza a doação do terreno à Souza & Cambos Confecções Ltda, sob as condições nela previstas (f. 56), decorreu de estudo realizado pela Comissão de Licitação, consoante se infere do excerto do voto condutor, verbis: " (...)Após a análise dos autos verifica-se que, efetivamente, a Administração municipal, após o levantamento realizado pela Comissão Especial instaurada com o objetivo de estudar a viabilidade da compra de terrenos no Distrito Industrial, concluiu pela dispensa de licitação para a aquisição dos referidos lotes, conforme se constata pelo documento de fl. 424-TJ.

No entanto, extrai-se que a dispensa de licitação e a posterior compra do terreno foi precedida de um estudo realizado pela referida Comissão, conforme se vê as f.127, a qual informou que "foram visitados vários terrenos, dentre os quais foi considerado o mais apropriado para futuras instalações da empresa Souza e Cambos Ltda, levando-se em conta a localização e infra estrutura", concluindo que o terreno escolhido era aquele pertencente à empresa Transporte Biagini Ltda (...)" 8. O caráter sancionador da Lei 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às instituições e notadamente: a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); b) causem prejuízo ao erário público (art. 10); c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse tópico a lesão à moralidade administrativa.

9. A exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público, deve se realizada cum granu salis, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público, preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir além de que o legislador pretendeu.

10. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do administrador.

11. À luz de abalizada doutrina: "A probidade administrativa é uma forma de moralidade administrativa que mereceu consideração especial da Constituição, que pune o ímprobo com a suspensão de direitos políticos (art. 37, §4º). A probidade administrativa consiste no dever de o "funcionário servir a Administração com honestidade, procedendo no exercício das suas funções, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer". O desrespeito a esse dever é que caracteriza a improbidade administrativa. Cuida-se de uma imoralidade administrativa qualificada. A improbidade administrativa é uma imoralidade qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem(...)." in José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional Positivo, 24ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2005, p-669.

12. Entrementes, na presente demanda, restou amplamente provado que a conduta do agente político e dos co-réus, não resultou em lesão ao erário público, nem configurou enriquecimento ilícito dos mesmos, o que conduz à inaplicação dos arts. 9º e 10, da Lei 8.429/92, além do fato de que o ato apontado improbo não amolda à conduta prevista no art. 11, à míngua de lesão aos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa, tendo em vista que a dispensa de licitação sub examine decorreu de estudo realizado pela Comissão de Licitação, consoante se infere do teor do voto condutor do acórdão recorrido.

13. Inexiste ofensa ao art. 535, I e II, CPC, quando o Tribunal de origem pronunciou-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos embargos de declaração, estando o decisum hostilizado devidamente fundamentado. Saliente-se, ademais, que o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão, como de fato ocorreu no voto condutor do acórdão de apelação às fls. 737/742, mormente quando a pretensão veiculada pela parte embargante revela nítida pretensão de rejulgamento da causa, consoante reconhecido pelo Tribunal local por ocasião do julgamento dos embargos de declaração (fls. 762/764 e 792/794).

14. Recurso especial parcialmente conhecido, e nessa parte, desprovido.

(REsp 797.671/MG, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/06/2008, DJe 16/06/2008)


FONTE: www.stj.jus.br, acesso em 18.01.2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário