quinta-feira, 26 de abril de 2012

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. INEXISTÊNCIA DE DOLO.


IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 11, I, DA LIA. DOLO.

A Turma, por maioria, deu provimento ao recurso para afastar a condenação dos recorrentes nas sanções do art. 11, I, da Lei de Improbidade Administrativa (LIA) sob o entendimento de que não ficou evidenciada nos autos a conduta dolosa dos acusados. Segundo iterativa jurisprudência desta Corte, para que seja reconhecida a tipificação da conduta do agente como incurso nas previsões da LIA é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos arts. 9º (enriquecimento ilícito) e 11 (violação dos princípios da Administração Pública) e, ao menos, pela culpa nas hipóteses do art. 10º (prejuízo ao erário). No voto divergente, sustentou o Min. Relator Teori Zavascki que o reexame das razões fáticas apresentadas no édito condenatório pelo tribunal a quo esbarraria no óbice da Súm. n. 7 desta Corte, da mesma forma, a revisão da pena fixada com observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. REsp 1.192.056-DF, Rel. originário Min. Teori Albino Zavascki, Rel. para o acórdão Min. Benedito Gonçalves, julgado em 17/4/2012.

FONTE: Informativo de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - N° 0495

quarta-feira, 25 de abril de 2012

LICITAÇÃO. ATESTADO DE CAPACIDADE TÉCNICA. LIMITE.


A exigência de atestados de capacidade técnica com registro de quantitativos superiores aos do serviço que se pretende contratar configura restrição ao caráter competitivo de certame licitatório e justifica sua suspensão cautelar 

Representação apontou possíveis irregularidades no âmbito do Pregão Eletrônico nº 302/2011 promovido pelo Hospital Universitário de Brasília (HUB) para contratação de serviços de limpeza hospitalar. Constou do respectivo edital requisito de habilitação (subitem 11.2.4) segundo o qual a licitante melhor classificada na fase de lances deveria apresentar “atestado de capacidade técnica comprovando a prestação de serviços em estabelecimento de saúde com, no mínimo, 250 leitos”, o que superaria a número de leitos do HUB estimados em 200. Fundamentalmente por considerar que tal exigência não se ajusta aos balizamentos contidos nos comandos do art. 3º, § 1º, inc. I, e do art. 30, inc. II, o relator concedeu medida cautelar para suspender o certame, a qual foi ratificada pelo Plenário. A empresa Dinâmica Administração, Serviços e Obras Ltda., que havia sido habilitada e classificada no certame, inconformada com a medida adotada, interpôs contra ela agravo. O relator ressaltou, então, que a jurisprudência do Tribunal aponta no sentido de admitir para a demonstração de capacidade operacional a exigência de apresentação de atestados que comprovem a execução de, no máximo, “50% dos quantitativos dos itens de maior relevância da obra ou serviço licitado”. No caso concreto, “a exigência ... extrapolaria o percentual de 100%!”, sem que houvesse justificativas para tanto. Além disso, os serviços de limpeza a serem executados nas áreas hospitalares críticas atingem apenas 28% da área total licitada. Anotou que “potenciais licitantes”, ao se depararem com a referida exigência, “podem ter tomado de imediato a decisão de não participar do certame”. Debruçou-se ainda sobre o pedido de “nova análise da habilitação dos licitantes com o critério de 50% do quantitativo da capacidade técnica indicada no certame”. Ponderou, entretanto, que não poderia ser ele atendido, visto que isso implicaria “flagrante violação aos princípios da vinculação ao instrumento convocatório e do julgamento objetivo”. O Tribunal, então, ao acolher sua proposta, conheceu o agravo e negou provimento a esse recurso, para manter inalterada a referida medida cautelar. Acórdão n.º 897/2012-Plenário, TC 003.818/2012-8, rel. Min. José Jorge, 18.4.2012.

IMPORTAÇÃO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO IMPORTADOR.

DECISÃO
Importador é responsável por tributos sobre bem importado locado irregularmente

Quando um bem importado com isenção de impostos é locado antes dos cinco anos previsto no artigo 137 do Decreto 91.030/85, os tributos devem ser pagos e são de responsabilidade originária do importador e não do locador. A decisão é da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em disputa entre uma empresa médica e a fazenda nacional. 

Ambas recorreram ao STJ contra julgado do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). Os magistrados de segundo grau entenderam que havia responsabilidade solidária entre a empresa e o importador. Afirmaram que a isenção do bem era vinculada apenas ao importador e, como houve locação, seriam devidos o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e Imposto de Importação ante o uso irregular do bem por entidade não beneficiada pelo regime de isenção. 

O TRF5 também considerou que, por haver solidariedade entre o locador e o importador, a Receita Federal poderia escolher qualquer um dos devedores para arcar com os tributos e não haveria ilegalidade em apenas o locador ser inscrito em dívida ativa. A decisão considerou ainda que não caberiam acréscimos moratórios, pois o crédito tributário ainda não teria sido definitivamente constituído. 

No recurso ao STJ, a empresa alegou não haver solidariedade onde não há devedor principal e que a Certidão de Dívida Ativa (CDA) seria nula, pois o locador do bem importado não constaria como devedor principal, conforme exigido pelo artigo 202, inciso I, do Código Tributário Nacional (CTN). 

A empresa também apontou ofensa ao artigo 896 do Código Civil, que determina que o título de crédito não pode ser reivindicado se o portador o adquiriu de boa-fé e seguindo as normas que disciplinam a sua circulação. Já a fazenda afirmou que, de acordo com o artigo 161 do CTN, os juros moratórios devem contar a partir do vencimento do crédito tributário. 

Responsável tributário 

O ministro Francisco Falcão, relator do processo, concluiu haver solidariedade de fato, pois o locador teria interesse comum na situação. “Não obstante, ao lançar o auto de infração, a fazenda nacional não incluiu o responsável tributário principal (o importador), atacando diretamente o locatário”, destacou o ministro. 

O relator afirmou que o artigo 121 do CTN explicita que o sujeito passivo da obrigação é o responsável pelo pagamento do tributo. Já que o responsável pelo imposto de importação é o importador e sendo dele a responsabilidade pela burla à isenção, é contra ele que dever ser emitido o auto de infração. 

Falcão apontou que o STJ já reconheceu que a responsabilidade tributária deve ser atribuída ao contribuinte de fato, autor do desvio, e não ao terceiro de boa-fé, como na hipótese dos autos, em que o locador não tem como verificar a origem fiscal do aparelho. 

A possibilidade de a fazenda indicar responsável solidário foi reconhecida pelo ministro Falcão. Entretanto, ele observou, o importador é parte legítima para responder pelo tributo e, por isso, deve constar no auto de infração. “Tanto é assim que o artigo 134 do CTN expressamente dispõe que, nos casos de impossibilidade de exigência do cumprimento da obrigação principal pelo contribuinte, respondem solidariamente os que intervieram ou se omitiram”, afirmou. 

Considerando que o caso não tratava de solidariedade estrita, a Turma seguiu o voto do relator para dar provimento ao recurso especial da empresa, anulando o débito fiscal, de forma que o recurso da fazenda ficou prejudicado. 


FONTE: www.stj.jus.br, acesso em 25.04.2012
Processo: REsp 1294061

LITISCONSÓRCIO PASSIVO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. ANULAÇÃO DO PROCESSO.


Anulado processo no STJ por falta de citação de interessados

Por 3 votos a 1, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (24) que processo originado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), em que se discute a licitação de serviço de radiodifusão em Porto Alegre (RS), será anulado desde a origem por falta de citação de todas as empresas interessadas (litisconsortes passivos necessários).

A decisão seguiu o voto do ministro Marco Aurélio, relator do caso. A controvérsia iniciou-se quando o Ministério das Comunicações anulou a outorga de serviço de radiodifusão concedido à empresa Sistema Nativa de Comunicações Ltda. por meio de licitação, para transmissão do canal 24 em Porto Alegre. Inconformada, a empresa ingressou com Mandado de Segurança no STJ para anular o ato do Ministério das Comunicações. A empresa chegou a obter liminar para suspender o ato (que fica mantida pela decisão desta tarde) e continuar prestando o serviço, mas, no mérito, o pedido foi negado.

Em seguida, a empresa recorreu ao STF, por meio do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança (RMS) 28256, distribuído ao ministro Marco Aurélio. Em fevereiro de 2010, quando a matéria começou a ser julgada, o relator afirmou que o processo teria de ser saneado desde a origem porque outras empresas interessadas na matéria não foram incluídas na causa.

Na ocasião, ele explicou que o ato do Ministério das Comunicações transbordou o campo dos interesses da empresa Nativa, beneficiando outra empresa. “Vale dizer, com o afastamento da homologação (concessão do serviço de radiodifusão) referida convocou-se a segunda interessada, ao que tudo indica, a Televisão Diamante Ltda., a pronunciar-se sobre o interesse de assumir o objetivo da licitação, ficando credenciada para as transmissões”, informou o ministro no julgamento ocorrido em 2010.

Assim, ele propôs, de ofício (por iniciativa própria, sem solicitação de umas das partes no processo), a citação, no processo em curso no STJ, de todas as empresas que, na via direta, pudessem ter interesse na causa. “Na espécie, é extreme de dúvidas que deveriam participar da relação processual, como litisconsortes passivos necessários, a Televisão Diamante Ltda. e, para hipótese de não manifestar vontade em ver-se vencedora da licitação, os classificados seguintes”, disse na ocasião.

O julgamento acabou sendo suspenso por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli, que proferiu seu voto nesta tarde. Ele foi o único a discordar do relator. “Não cabe litisconsorte necessário porque o ato invalidou a homologação em favor da empresa (Nativa), logo, desfez direito da empresa e não direito de terceiro”, disse. Para ele, as demais empresas que participaram da licitação do serviço de radiodifusão tinham somente expectativa de direito.

As ministras Cármen Lúcia Antunes Rocha e Rosa Weber acompanharam o relator do processo, ministro Marco Aurélio.

FONTE: www.stf.jus.br, acesso em 25.04.2012

terça-feira, 24 de abril de 2012

OAB QUER REVISÃO SOBRE NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO PARA PROCESSAR GOVERNADORES.


OAB quer rever autorização prévia para processar governadores
segunda-feira, 23 de abril de 2012 às 16h38


Brasília – O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, ajuizou hoje perante o Supremo Tribunal Federal três ações diretas de inconstitucionalidade (Adins) contra dispositivos das Constituições dos Estados do Acre, Amapá e Alagoas que definem competências das respectivas Assembleias Legislativas para processar e julgar os governadores em crimes comuns e nos crimes de responsabilidade e exigem autorização prévia delas para a instauração do processo contra referidos agentes públicos. A ação sobre o Acre (Adin n° 4764) ficou sob relatoria do ministro Celso de Mello, enquanto as relativas ao Amapá (Adin nº 4765) e Alagoas (Adin nº 4766) foram distribuídas ao ministro Luiz Fux.

Segundo o presidente nacional da OAB, a entidade ajuizou esse primeiro lote de ações – a intenção é apresentá-las em relação a todas as Constituições estaduais -, em virtude de decisão unânime do Pleno do seu Conselho Federal em sessão do dia de 6 março último, por entender que não pode ficar ao sabor de humores ou manobras das Assembleias o poder de processar e julgar governadores. O entendimento é que cabe ao Superior Tribunal de Justiça (STF) processar e julgar os governadores, conforme determina a Constituição Federal e a Lei. 

O texto das Adins ressalta a preocupação da OAB de evitar prejuízos à cidadania e ao princípio republicano pela ausência de responsabilização dos governadores faltosos, diante da aplicação de normas de constituições estaduais que condicionam o processo e julgamento de governador à prévia admissão da acusação por dois terços dos deputados estaduais. “Não desconhece este Conselho Federal a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a questão de fundo, mas a indignação popular e as manobras imorais realizadas pelas Assembléias Legislativas para impedir que governadores possam ser processados e julgados pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ em casos de robusta prova de culpabilidade, conforme recentes escândalos morais e éticos, justificam o revolvimento da questão e da jurisprudência desse Egrégio Tribunal”, afirma.

De acordo com fundamentos citados pela OAB para pedir a inconstitucionalidade dos dispositivos das constituições estaduais, eles representam “evidente usurpação de competência legislativa privativa da União Federal e afronta à legislação federal aplicável à espécie, bem como contrariam princípios constitucionais inerentes à República e ao regime de responsabilidade que estão submetidos os agentes políticos”. Tais normas das constituições dos três Estados(artigos 44, VII e VIII, e 81 do Acre; artigos 95, XI, e 121 do Amapá, e artigos 79, I, e 110 de Alagoas), conforme as ações, “tratam de matéria processual-penal (inconstitucionalidade formal) ao definir o julgamento dos crimes de responsabilidade perante a Assembleia Legislativa, eis que condicionam a admissão da acusação ao voto de dois terços dos Deputados”.

Conforme o teor das ações do Conselho Federal da OAB, tais dispositivos são inconstitucionais não só pela usurpação de competência legislativa da União Federal, como também pelo desrespeito ao contido na Lei nº 1.079/50, sendo patente a violência ao art. 22, I, da Carta Federal. “Mas não é só. Há também inconstitucionalidade material, vejamos: da transcrição dos dispositivos ora impugnados constata-se, ainda, que a exigência de prévia autorização da Assembléia Legislativa para fins de autorizar a instauração de ação penal em desfavor do governador (art. 81 - ‘Admitida a acusação contra o Governador, por dois terços da Assembléia Legislativa, ...’) ofende os princípios republicano e da Separação dos Poderes (arts. 1º e 2º, CF), bem como do acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, CF)”, afirmam as Adins.

BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. CLÁUSULA DE USUFRUTO VITALÍCIO EM FAVOR DA MÃE DO DEVEDOR.

DECISÃO
Mantida impenhorabilidade de bem de família em usufruto da mãe do devedor

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a impenhorabilidade de bem de família não habitado pelo devedor, mas por sua mãe em usufruto vitalício. A decisão nega pretensão do Banco do Brasil S/A, que afirmava a penhorabilidade do bem porque o devedor não dependia de seu aluguel. 

O ministro Luis Felipe Salomão explicou que o usufruto é um direito real personalíssimo, que fraciona o domínio do bem: “Ao usufrutuário é concedido o direito de desfrutar do bem alheio, percebendo-lhe os frutos e dele podendo retirar proveito econômico; ao nu-proprietário remanesce tão somente a posse indireta e o direito de dispor desse bem.” 

O relator esclareceu que, pelo caráter pessoal do usufruto, ele é impenhorável. Mas seus frutos podem ser penhorados. A nua-propriedade, porém, pode ser objeto de constrição, exceto se for bem de família. 

Dignidade 

Ele afirmou que a Constituição Federal estabelece a moradia como direito fundamental à dignidade da pessoa humana. Esse princípio, acrescentou, deveria nortear a interpretação de todas as normas jurídicas. 

“É o que se verifica, por exemplo, em diversos precedentes jurisprudenciais desta Corte Superior que entenderam pela extensão dessa proteção à morada do devedor solteiro, a despeito de o artigo 1º da Lei 8.009/90 ser explícito no sentido de instituir, como beneficiário da impenhorabilidade da residência familiar, o casal ou a entidade familiar”, avaliou o ministro. 

Salomão enfatizou que “a Constituição Federal alçou o direito à moradia à condição de desdobramento da própria dignidade humana, razão pela qual, quer por considerar que a genitora do recorrido é membro dessa entidade familiar, quer por vislumbrar que o amparo à mãe idosa é razão mais do que suficiente para justificar o fato de que o nu-proprietário habita imóvel alugado com sua família direta, ressoa estreme de dúvidas que o seu único bem imóvel faz jus à proteção”. 

Ele apontou ainda que o tribunal local afirmou não haver outras propriedades em nome do devedor, e que rever tal conclusão demandaria reexame de provas, impossível ao STJ em recurso especial. 


FONTE: www.stj.jus.br, acesso em 24.04.2012
Processo: REsp 950663

segunda-feira, 23 de abril de 2012

RECURSO ESPECIAL. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES.


Introdução ao Recurso Especial
por Roberto da Silva Freitas


1. Propósito desta série de artigos

Não é raro que profissionais do Direito, notadamente aqueles cuja militância restringe-se ao primeiro e ao segundo grau de jurisdição (instâncias ordinárias), deparem-se com dificuldades, de ordem teórica e/ou prática, ante a necessidade de acessar o Superior Tribunal de Justiça, notadamente com a interposição de recurso especial.

Nessa linha, esta série de artigos será integralmente dedicada ao recurso especial, apelo fundamental à manutenção da ordem jurídica. Abordaremos não só aspectos teóricos, mas, também, práticos. Pretende-se, assim, estabelecer um caminho, inclusive com a identificação de “armadilhas” jurisprudenciais, para aqueles que desejam recorrer, via apelo especial, ao Superior Tribunal de Justiça.

O objetivo deste primeiro artigo é familiarizar o leitor com as noções básicas do recurso especial, a fim de que os assuntos que serão tratados nos artigos subsequentes, em tese mais densos, possam ser enfrentados de forma mais suave. Assim, neste primeiro momento trataremos de temas como: origem histórica do recurso especial; hipóteses de cabimento; campo de incidência; finalidade e caráter político.


2. Superior Tribunal de Justiça e Recurso especial: uma notícia histórica

No Direito anterior à Constituição Federal de 1988, o Supremo Tribunal Federal era o guardião não só da Constituição Federal, mas também da legislação federal infraconstitucional. Essa missão era exercida por meio do recurso extraordinário. Com essa ampla competência, os trabalhos da Suprema Corte estavam próximos da completa inviabilização. Detectou-se, assim, a chamada “crise do STF” ou “crise do recurso extraordinário”[1].

A discussão nos meios jurídicos passou a ser em torno das possíveis soluções para a “crise do STF”. Num primeiro momento, a fim de solucionar esse problema, várias alternativas foram apresentadas. Dentre elas, é possível destacar a exigência de “argüição de relevância” da questão federal para admissão do recurso extraordinário, o aumento do número de ministros, dentre outros óbices legais e regimentais sugeridos e até implementados[2]. Fora cogitada, também, a criação de outro Tribunal, que abraçaria parte da competência do STF.

A fragilidade das três primeiras alternativas apresentadas para a solução do problema fez com que a idéia de criação de um novo Tribunal Federal ganhasse força. José Afonso da Silva, em 1963, ano da edição da obra “Do Recurso Extraordinário no Direito Processual Brasileiro”, já defendia a criação de um novo Tribunal Superior, que denominou de Tribunal Superior de Justiça – TSJ[3].

Em 1965, “uma mesa redonda foi formada na Fundação Getúlio Vargas, presidida pelo Min. Themístocles Brandão Cavalcanti e integrada por Caio Tácito, Lamy Filho, Flávio Bauer Novelli, Miguel Seabra Fagundes, Alcino de Paula Salazar, Caio Mário da Silva Pereira, José Frederico Marques, Gilberto Ulhôa Canto, Levy Fernandes Carneiro, Mário Pessoa e Miguel Reale. A ilustre plêiade de juristas discutiu acerca da viabilidade da criação de um Tribunal Superior, para julgar recursos extraordinários relativos ao direito federal comum”[4].

Atenta a essa questão, a Constituinte de 1988 criou o Superior Tribunal de Justiça com competência para, por meio do recurso especial(art. 105, III, da CF), velar pela correta aplicação e unidade interpretativa da legislação federal infraconstitucional. Com a criação do Superior Tribunal de Justiça e do recurso especial, houve um desmembramento do recurso extraordinário, de modo que este remédio passou a tratar de questões eminentemente constitucionais (art. 102, III, CF/88), fazendo com que o recurso especial abraçasse a competência de natureza infraconstitucional relativa à legislação federal, antes deferida ao Supremo Tribunal Federal.

Assim nasceram o Superior Tribunal de Justiça, hoje chamado de “Tribunal da Cidadania”, e o seu instrumento de atuação mais importante, que o constituinte originário denominou de recurso especial.


3. Hipóteses de cabimento, previsão constitucional, legal e regimental

O recurso especial é cabível pelo simples fato de estar previsto na Constituição e na legislação de regência[5]. É, por outro lado, adequado para impugnar as causas decididas em única ou última instância pelos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal e pelos Tribunais Regionais Federais[6], nas hipóteses elencadas no art. 105, III, “a”, “b” e “c”. Nesse contexto, referido dispositivo prevê que:

Art. 105. Compete ao Superior Tribunal de Justiça:
...................................
III – julgar, em recurso especial, as causas decididas em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelo Tribunal dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, quando a decisão recorrida:
a) contrariar tratado ou lei federal ou negar-lhes vigência;
b) julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal[7];
c) der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal.

Na legislação ordinária, está disciplinado nos arts. 541 a 546 do CPC e 26 a 29 da Lei 8.038/90. Regimentalmente, encontra-se nos arts. 255 a 257 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.


4. Campo de incidência

A Constituição Federal de 1988 não restringiu, a princípio, o campo de incidência do recurso especial (art. 105, III, alíneas). Todas as questões controvertidas atinentes à correta aplicação do direito federal infraconstitucional podem, a princípio, ser objeto de recurso especial. Pode versar, portanto, sobre matérias de Direito Público (Administrativo, Tributário etc.) e de Direito Privado (Civil, Comercial e Consumidor[8]).

A princípio, as matérias de competência da Justiça Especializada (trabalhista, eleitoral e militar) não podem ser discutidas em sede de recurso especial. Mas essa afirmação não deve ser encarada como uma verdade absoluta, mas, sim, com temperos. Senão, vejamos.

No que tange à matéria trabalhista, é imprescindível que se diferenciem duas situações: a relativa a servidores públicos estatutários e as demais questões trabalhistas. Em relação à primeira questão, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.395/DF, deferiu liminar para suspender qualquer interpretação do art. 114, I, da Constituição do Brasil, que atribuísse à Justiça do Trabalho competência para processar e julgar as “causas trabalhistas”[9]entre o Poder Público e seus servidores estatutários[10].

Em sendo da Justiça Comum (federal ou estadual, conforme o caso) a competência para processar e julgar as causas de natureza trabalhista (jurídico-administrativa, em sentido estrito) que envolvam servidores públicos estatutários, nada mais natural que o Superior Tribunal de Justiça tenha competência para apreciar recursos especiais sobre o tema. As demais questões de índole trabalhista, notadamente aquelas que envolvem trabalhadores sujeitos à CLT, não podem ser discutidas em sede de recurso especial.

O recurso especial é instrumento idôneo para apreciar matéria penal militar, em se tratando de militares estaduais. Por outro lado, os militares da União estão sujeitos à jurisdição da auditoria militar e do Superior Tribunal Militar[11].

Finalmente, não pode o recurso especial versar sobre matéria eleitoral nem constitucional. Quanto às questões de índole constitucional, caso se entendesse de forma diversa, estar-se-ia a usurpar a competência do Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal (art. 102, caput, da Constituição Federal de 1988). É óbvio, embora nem para todos o seja, que se a questão constitucional surgir incidentalmente no recurso especial, nada impede que o Superior Tribunal de Justiça aprecie a questão, afinal o dever de zelar pela Constituição é de todos os órgãos do Poder Judiciário. Cite-se, como exemplo, o incidente de inconstitucionalidade, que é perfeitamente cabível em recurso especial.


5. Finalidade do recurso especial

A finalidade do recurso especial (bem como de todos os recursos de natureza extraordinária) há de ser aferida sob duas óticas distintas. Há, pois, uma finalidade imediata e outra mediata.Do ponto de vista imediato, pode-se afirmar que o recurso especial é remédio jurídico-constitucional que se destina a zelar pela inteireza e uniformização do direito federal infraconstitucional. Essa foi, em suma, a razão de ser da sua criação, conforme já explicitado.

Numa análise ainda mais específica desse fim imediato, é possível concluir que a preservação do direito federal infraconstitucional será feita sempre à luz da análise de uma questão federal controvertida, extraída do art. 105, III, “a”, “b” e “c” da Constituição Federal. Nessa linha de raciocínio, temos que a finalidade do recurso especial será especificamente:

a) manter a integridade e vigência de lei federal, na hipótese da alínea “a”; 
b) garantir a autoridade de lei federal em relação aos atos de governo local, na hipótese da alínea “b”;
c) uniformizar a interpretação em torno da legislação federal, na hipótese da alínea “c”, ou seja, quando houver divergência entre tribunais diversos acerca da interpretação de lei federal[12].

Veja-se que, qualquer que seja a hipótese do cabimento do recurso especial (alíneas “a”, “b” ou “c” do permissivo constitucional), há uma necessária vinculação da finalidade imediata desse recurso com a preservação da ordem jurídica, no que tange à manutenção da inteireza do direito positivo infraconstitucional. Não se pretende, pelo menos de forma imediata, preservar direitos subjetivos das partes envolvidas no litígio. O que se quer, mediante interposição do recurso especial, é assegurar a vigência, inteireza e uniformidade da legislação federal infraconstitucional.

Se o recurso especial é, sob uma ótica imediatista, um instrumento de tutela da ordem jurídica não se pode deixar de considerar a sua finalidade mediata,consubstanciada na preservação de direitos subjetivos da parte recorrente, que, para tutelá-los, invoca a existência de uma questão federal controvertida. O provimento do recurso especial resguarda, de forma indireta, os direitos do recorrente.

Em outras palavras: a interposição do recurso especial visa, num primeiro momento, preservar a inteireza e uniformização do direito federal infraconstitucional; porém, seria utópico pensar que uma parte recorreria ao STJ, via apelo especial, tão-somente para ver preservada a lei federal; quer, na verdade, ver os seus direitos protegidos e, para isso, invoca a existência de uma questão federal controvertidaque, como veremos no momento oportuno, é pressuposto específico de admissibilidade dos recursos de caráter extraordinário.


6. A função política do recurso especial

Os recursos extraordinários, dentro os quais se insere o recurso especial, prestam-se à preservação da ordem jurídica federal e nisso consiste a sua função política[13], uma vez que, ao proteger o ordenamento jurídico, está protegendo o próprio Estado de Direito, cujo alicerce é o postulado legal. Não são recursos meramente processuais que visam a satisfazer interesses próprios das partes, mas, acima de tudo, recursos político-constitucionais, que tutelam o ordenamento jurídico.

Como já nos manifestamos em estudo específico sobre o tema, “os recursos extraordinários respondem imediatamente a questões de ordem pública, fazendo prevalecer a autoridade e a exata aplicação da Constituição e da legislação federal infraconstitucional, conforme seja caso de recurso extraordinário stricto sensu ou recurso especial”[14].

No mesmo sentido leciona Athos Gusmão Carneiro, para quem “o interesse privado do litigante vencido, então, funciona mais como móvel e estímulo para a interposição do recurso extremo, cuja admissão, todavia, liga-se à existência de uma questão federal, à defesa da ordem jurídica no plano do direito federal...”[15].

É certo que, quando se interpõe um recurso especial, quer o recorrente, na verdade, ver seus interesses protegidos pela tutela jurisdicional a ser obtida em sede de apelo extremo. Mas, caso não invoque a existência de uma questão federal controvertida pertinente à aplicação de lei federal, o recurso não será admitido. Caso queira, por exemplo, discutir apenas a justiça ou a injustiça da decisão, com revisão, inclusive, de aspectos fáticos ou probatórios, o apelo não terá seguimento. Portanto, os recursos extraordinários – recursos políticos que são – não podem ser manejados sob a mera alegação de sucumbência ou de injustiça da decisão recorrida, diante do seu caráter eminentemente político.

Destarte, pode-se afirmar que o Superior Tribunal de Justiça, destinatário do recurso especial, é um tribunal político, pois o seu fundamento de existência – e consequentemente do recurso especial – reside no interesse estatal de assegurar, em todo o território federal, a inteireza positiva, a validade, a autoridade e a uniformidade de interpretação das leis federais[16].

Presta, pois, uma atividade jurisdicional atípica, diversa daquela prestada pelas instâncias ordinárias, ao atuar como guardião do Direito objetivo federal. Em suma, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar um recurso especial, aprecia mais a legalidade da decisão recorrida do que o próprio direito das partes envolvidas no litígio[17].

REFERÊNCIAS

CARNEIRO, Athos Gusmão. Recurso Especial, Agravos e Agravo Interno: Exposição didática – Área do Processo Civil, com invocação à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.Rio de Janeiro, Forense, 2005.
__________. Anotações sobre o Recurso Especial. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991.

CRISPIN, Mirian Cristina Generoso Ribeiro. Recurso Especial e Extraordinário. São Paulo: Pillares, 2006.

FREITAS, Roberto da Silva. Recursos ordinários e extraordinários: diferenças. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 965, 23 fev. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8003>. Acesso em: 02 set. 2009.

__________. Anotações sobre o recurso especial pela divergência jurisprudencial . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1121, 27 jul. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8682>. Acesso em: 05 set. 2009.

MANCUSO, Rodolfo Mancuso. Recurso Extraordinário e Recurso Especial. Coleção Recursos no Processo Civil, vol. 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

RIBEIRO, Antônio de Pádua. Do Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991.

SANTOS, Francisco Cláudio de Almeida Santos. Recurso Especial – Visão Geral. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991.

SILVA, José Afonso da. Do Recurso Extraordinário no Direito Processual Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963.


[1] O Ministro Francisco Cláudio de Almeida Santos, em exposição sobre os antecedentes de criação do STJ e do recurso especial, noticia que “os recursos extraordinários, em número de 17.000, até 1950, isto é, nos primeiros sessenta anos de atividade do Supremo na República, e em número de aproximadamente 60.000, no final de 1965, saltaram para quase 120.000, em números, no final de 1988, segundo os registros citados e outras fontes”. SANTOS, Francisco Cláudio de Almeida Santos.Recurso Especial – Visão Geral. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 91-92.

[2] A primeira de tantas soluções para a crise deu-se através da Lei nº 3.396/1958, que passou a exigir a fundamentação da decisão do presidente do Tribunal a quo de admissão do recurso extraordinário, pois, em fase anterior, somente as decisões de inadmissão é que necessitavam de fundamentação. A EC 1/69 restringiu as hipóteses de cabimento do recurso extraordinário, enquanto o Regimento Interno do STF, por diversas vezes, criou óbices à admissão daquele recurso. Tudo com a finalidade de extinguir ou aliviar a crise. Cf., nesse sentido, SANTOS, Francisco Cláudio de Almeida. Op. cit., p. 92-93; MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Op. cit., p. 72-79, CRISPIN, Mirian Cristina Generoso Ribeiro. Recurso Especial e Extraordinário. São Paulo: Pillares, 2006, p. 48-53.

[3] SILVA, José Afonso da. Do recurso extraordinário no Direito Processual Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1963, p. 456. Assim se manifestou o mestre: “esse é o defeito que precisa ser eliminado com a criação de, pelo menos, um Tribunal Superior, cuja função será a de exercer as atribuições de órgão de cúpula e de composição das estruturas judiciárias defeituosas, há pouco mencionadas (...) Tal órgão, que denominaríamos de Tribunal Superior de Justiça por uma questão de uniformidade terminológica, relativamente aos já existentes, teria como competência fundamental, entre outras, julgar, em grau de recurso, as causas decididas em única ou última instância pelos tribunais ou juízes estaduais, dos feitos da fazenda nacional ou militares: a) quando a decisão recorrida fôsse contrária à letra de tratado ou lei federal; b) quando se contestasse a validade de lei ou ato de govêrno local em face de lei federal, e a decisão recorrida aplicasse a lei ou ato impugnado; c) quando na decisão recorrida a interpretação da lei federal invocada fôsse (sic) diversa da que lhe haja dado qualquer tribunal estadual, ou tribunal militar ou o Tribunal Federal de Recursos, ou divergisse de decisão por ele próprio proferida”.

[4] MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso Extraordinário e Recurso Especial. Coleção Recursos no Processo Civil, vol. 3. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006 p. 103.

[5] Somos adeptos da corrente doutrinária que diferencia, no que tange aos pressupostos de admissibilidade recursais, “cabimento” de “adequação”. O “cabimento” decorre do simples fato de o recurso estar previsto em lei. Logo, são cabíveis todos os recursos elencados em lei como tal. Denota, nesse sentido, proximidade com o princípio da taxatividade. A “adequação”, por sua vez, indica o recurso correto para impugnar uma determinada decisão. Logo, o agravo é o recurso cabível e adequado para impugnar decisões interlocutórias.

[6] Como veremos no momento oportuno, a decisão impugnada via recurso especial deve ser oriunda de Tribunal de Justiça ou de Tribunal Regional Federal. Essa origem da decisum vergastado é pressuposto específico da admissibilidade do recurso especial. Por essa razão, não se admite recurso especial interposto contra decisão de turma recursal dos juizados especiais.

[7] Inciso alterado pela Emenda Constitucional nº 45/2005 (Reforma do Judiciário). Redação anterior: “julgar válido ato ou lei de governo local contestado em face de lei federal”.

[8] Não se desconhece, aqui, a polêmica doutrinária acerca do enquadramento do Direito do Consumidor como ramo do Direito Público ou do Direito Privado.

[9] Só em sentido amplo é que essa matéria seria trabalhista. Na verdade, trata-se de questão jurídico-estatutária e não estritamente trabalhista. Isso justifica a decisão do Supremo Tribunal Federal.

[10] Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária. (ADI 3395 MC, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Tribunal Pleno, julgado em 05/04/2006, DJ 10-11-2006 PP-00049 EMENT VOL-02255-02 PP-00274 RDECTRAB v. 14, n. 150, 2007, p. 114-134 RDECTRAB v. 14, n. 152, 2007, p. 226-245).

[11] Registre-se que a Justiça Militar da União é formada apenas por dois graus de jurisdição: no primeiro grau, temos as auditorias militares e, em segundo, o Superior Tribunal Militar. Trata-se, na verdade, de tribunal de segundo grau, e não superior no sentido rigoroso do termo.

[12] Sobre o recurso especial pela alínea “c” (divergência jurisprudencial), vide: FREITAS, Roberto da Silva. Anotações sobre o recurso especial pela divergência jurisprudencial . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1121, 27 jul. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8682>. Acesso em: 05 set. 2009.

[13] Cf. SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 107.

[14] FREITAS, Roberto da Silva. Recursos ordinários e extraordinários: diferenças. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 965, 23 fev. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8003>. Acesso em: 02 set. 2009.

[15] CARNEIRO, Athos Gusmão. Anotações sobre o Recurso Especial. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991, p.110.

[16] SILVA, José Afonso da. Op. cit., p. 105-106.

[17] RIBEIRO, Antônio de Pádua. Do Recurso Especial para o Superior Tribunal de Justiça. In: TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coord.). Recursos no Superior Tribunal de Justiça. São Paulo: Saraiva, 1991, p. 135-136

FONTE: http://jusvi.com/artigos/45981, acesso em 23.04.2012

USUCAPIÃO TABULAR. IMÓVEL COM MATRÍCULA BLOQUEADA. POSSIBILIDADE EM APLICAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.

DECISÃO
Terceira Turma reconhece aplicação de usucapião tabular em imóvel com bloqueio de matrícula

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que a Justiça paulista prossiga na análise de uma ação de usucapião tabular movida por compradores de um imóvel que teve a matrícula bloqueada há mais de 12 anos. 

A lei prevê a aplicação do instituto apenas para os casos em que há cancelamento do registro do imóvel. No entanto, tendo em vista o longo tempo do bloqueio, independentemente de processo para declarar a nulidade do registro, a Terceira Turma equiparou-o ao cancelamento do registro de propriedade. 

O imóvel foi adquirido em 1996 de uma empresa. A questão jurídica teve início em 1999, quando os compradores, depois de registrarem o imóvel no ano anterior, viram a matrícula ser bloqueada por decisão judicial. 

O bloqueio se deu pela constatação do INSS de que era falsa uma certidão negativa de tributos previdenciários apresentada pela empresa vendedora, que possui débitos com a autarquia. A legislação brasileira estabelece como exigência para o registro de uma compra e venda a apresentação de certidão negativa de tributos previdenciários. 

Os compradores tentaram levantar o bloqueio por diversos meios, sem sucesso. Em 2007, ou seja, mais de dez anos depois da compra do imóvel e sete anos depois do bloqueio, eles ajuizaram a ação de usucapião tabular, ou documental, que tem como propósito proteger o proprietário que tinha o registro, o qual foi cancelado por vício de qualquer natureza. 

Direito limitado

Em primeiro grau, a petição inicial foi indeferida. O juiz considerou que o prazo da prescrição aquisitiva (cinco anos) ainda não teria sido completado no momento do ajuizamento da ação. Disse, ainda, que não seria o caso de pleitear usucapião tabular, porque o registro do imóvel não foi cancelado, mas bloqueado, e que aquele seria requisito indispensável. 

No STJ, o recurso foi interposto pelos compradores do imóvel. A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que, com o bloqueio, o direito de propriedade permanece vigente, mas limitado. “Ele [comprador/proprietário] pode usufruir do imóvel, nele permanecendo ou o alugando, mas não pode fazer muito mais que isso”, observou. 

A ministra considerou absurdo que o bloqueio da matrícula para proteção de um crédito se estenda eternamente, ainda que ele não produza a invalidade do registro de propriedade. “Se o bloqueio permaneceu hígido independentemente de processo tendente à declaração de nulidade do registro, é possível equipará-lo ao cancelamento do registro de propriedade”, disse. 

A relatora entendeu que a providência tomada pelos compradores/proprietários é compatível com a que o direito oferece: “Aguardaram que o INSS se posicionasse, pleiteando a nulidade da venda para proteção de seu crédito.” No entanto, a instituição não requereu a nulidade da escritura ou a penhora do bem. Ao contrário, permaneceu inerte e, para a ministra, alguma consequência deve sair disso. 

Assim, a Turma reconheceu o interesse de agir dos compradores/proprietários na usucapião tabular e determinou que o processo tenha seguimento na primeira instância, com a citação da empresa. 


FONTE: www.stj.jus.br, acesso em 23.04.2012
Processo: REsp 1133451

SEMINÁRIO SOBRE REGIME JURÍDICO. DISCUSSÃO DE JULGADOS PROFERIDOS PELO STJ.

EVENTOS
Jurisprudência sobre Lei 8.112 abre segundo dia do Seminário de Direito Administrativo

Examinar as decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o regime jurídico único dos servidores públicos. Esta era, na manhã de sexta-feira (20), a missão dos palestrantes que participaram do Seminário de Direito Administrativo no auditório externo do Tribunal da Cidadania. 

O primeiro painel do último dia do encontro foi presidido pela procuradora-geral da Advocacia Geral da União (AGU), Helia Mária de Oliveira Bettero. “Estamos aqui com palestrantes do mais alto nível a fim de contribuir para a defesa do interesse público, nosso interesse maior. Todos nós devemos nos empenhar para administrar a Justiça por meio de uma eficiência aberta e progressista. As decisões do STJ são bússolas, mas o excesso de litigiosidade é um empecilho. Todos os setores da sociedade devem buscar meios para reduzir o número de recursos”, ressaltou. 

A professora Fernanda Mathias de Souza Garcia, assessora jurídica do gabinete do ministro Villas Bôas Cueva, abriu as apresentações analisando julgados de destaque sobre a Lei 8.112/90, que estabeleceu o regime único dos servidores públicos civis da União. “O STJ tem diversos casos emblemáticos sobre a questão. Hoje é a Primeira Seção que julga os processos envolvendo o assunto, mas antes o tema era da responsabilidade da Terceira Seção”, relembrou. 

Concurso público 

Fernanda Garcia destacou alguns julgados relevantes sobre concurso público. Entre eles, o que estabeleceu que os aprovados em certame dentro do limite de vagas têm direito líquido e certo à nomeação. “É preciso reconhecer que a jurisprudência firmada no Supremo Tribunal Federal (STF) nasceu das discussões no STJ. A tese nasceu nesta Casa”, afirmou a assessora. 

Outro julgado considerado relevante por ela é o que estabelece que o aprovado em concurso público não pode ser preterido por uma contratação temporária, mesmo que ele esteja fora do número de vagas inicialmente fixado (Informativo 488 do STJ): “Se a vaga surgir dentro da validade do certame, não se justifica contratar temporários, pois existem candidatos classificados no certame.” 

Uma decisão do STJ que chamou a atenção da palestrante é a que não reconheceu o direito à indenização de uma candidata aprovada em concurso público para cargo de promotora de Justiça do Rio Grande do Sul, por conta de nomeação tardia. Ela pedia o valor da remuneração que deixou de receber até a data efetiva da nomeação, que só ocorreu após a anulação judicial de critérios que a eliminaram da prova de títulos. 

O entendimento da Segunda Turma foi no sentido de atrelar a remuneração ao trabalho executado. Mas Fernanda Garcia salientou que há outra decisão, da lavra do então ministro Luiz Fux, que responsabiliza civilmente o estado por lesar o direito do candidato. “Os concursos estão cada dia mais complexos, exigindo muito dos candidatos. Não nomear alguém que passou por algum equívoco da administração gera, na minha opinião, uma clara lesão ao cidadão”, comentou Fernanda Garcia. 

A palestrante também levantou alguns casos de remoção. “Atualmente é possível pedir a remoção por interesse pessoal, mas é a administração pública que decide se remove ou não. O interesse particular não prepondera nesses casos”, enfatizou. 

Direito de greve 

Quanto à jurisprudência sobre o direito de greve, Fernanda Garcia apontou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) adotou posição recente a favor da legitimidade da greve no serviço público. Entretanto, a administração pública tem o direito de cobrar pelas horas não trabalhadas do servidor que aderir à paralisação, mesmo que a greve seja legal. “Neste âmbito”, disse a palestrante, “destaco voto vencido do ministro Hamilton Carvalhido, que pretendia garantir o direito do servidor a compensar as horas não trabalhadas antes de descontá-las do contracheque”. 

Por fim, a palestrante apresentou uma decisão considerada “interessantíssima”, de autoria da ministra Maria Thereza de Assis Moura: “Ela fez uma sinapse entre as Adins 1.717 e 2.135 do Supremo (Informativo 491 do STJ), que conferiram aos conselhos de classe (Crea, Cra, CRM etc.) a natureza de autarquia da fazenda pública. Desde 2007, portanto, esses órgãos de classe fazem concursos públicos para preencher seus quadros nos moldes da Lei 8.112.” 

Estágio e estabilidade 

O segundo painel da manhã ficou a cargo do assessor jurídico do STJ e professor Alessandro Garcia Vieira, que apresentou uma análise sobre o período de vigência do estágio probatório (artigo 20 da Lei 8112). “A lei estabelece 24 meses de estágio probatório, mas o STJ sufragou o entendimento (acompanhado pelo STF) de que, após a Emenda Constitucional 19/98, o prazo do estágio probatório passou a ser de três anos”, disse ele. A EC 19 fixou em três anos o prazo para aquisição de estabilidade no serviço público. 

Garcia Vieira citou um julgado do ministro Arnaldo Esteves Lima (MS 12.397) que estabelece a distinção entre os dois institutos jurídicos: “O estágio tem por objetivo aferir a aptidão e a capacidade do servidor para o desempenho do cargo público de provimento efetivo. A estabilidade constitui uma garantia de proteção adicional. Recordemos que a estabilidade nunca foi para o servidor, mas para o estado democrático de direito. E ela nunca foi absoluta. Portanto, ao meu ver, há uma incoerência em vincular o estágio probatório à estabilidade.” 

Todavia, o palestrante alertou que a matéria ainda não está pacificada. “Há órgãos que adotam 24 meses de estágio probatório e outros, os três anos. Mas, na minha opinião, creio que o estágio poderia ser de 12 meses. Afinal, as avaliações não podem ser pontuais, mas também não podem ser longas. Três anos é muito tempo. Quem de vocês conhece alguém que foi desligado por falta de habilidade/atitude após três longos anos?” 

O último painel da manhã coube ao professor e controlador-geral do estado de Minas Gerais Plínio Salgado, que discorreu sobre o instituto da vacância. O professor mencionou o julgado RMS 30.973, da relatoria da ministra Laurita Vaz, como referência do entendimento do STJ sobre o tema. 


FONTE: www.stj.jus.br, acesso em 23.04.2012

COMPROVAÇÃO DE TEMPESTIVIDADE. QUESTÃO DE ORDEM ALTERA POSICIONAMENTO ANTERIOR.

DECISÃO
Primeira Turma revê posição sobre comprovação de tempestividade de recursos

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou na quinta-feira (19) decisão tomada na sessão do último dia 12 e manteve a jurisprudência segundo a qual a tempestividade do recurso tem de ser demonstrada no momento de sua interposição. Essa exigência inclui a apresentação de comprovantes de feriados, quando eles alterarem o vencimento do prazo recursal. 

A decisão de rever o julgamento anterior decorreu do fato de que, no dia 12, estavam presentes à sessão apenas três dos cinco ministros que compõem a Primeira Turma, e o resultado representava mudança de entendimento em relação à jurisprudência já consolidada no STJ, inclusive pela Corte Especial. 

O caso em julgamento era o Agravo de Instrumento 1.368.507. Inicialmente, em junho, o presidente do STJ, ministro Ari Pargendler, julgou o agravo intempestivo. Contra essa decisão foi interposto agravo regimental. 

Ao apreciar o recurso interno na sessão de 12 de abril, o relator, Napoleão Nunes Maia Filho, votou pelo seu provimento, afastando a intempestividade, no que foi acompanhado pelos outros dois ministros presentes (leia aqui a notícia sobre a decisão anulada). 

Na sessão desta quinta-feira, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho disse considerar “simpática e liberal” a ideia de admitir a possibilidade de comprovação posterior do cumprimento de prazos recursais, em situações como a daquele processo, mas afirmou a necessidade de manter o alinhamento com a jurisprudência estabelecida na Corte, ainda que em conflito com recente entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal. 

Diante da questão de ordem levantada pelo relator, a Primeira Turma anulou o julgamento passado e negou provimento ao agravo regimental, mantendo a decisão que havia considerado o agravo de instrumento intempestivo. 


FONTE: www.stj.jus.br, acesso em 23.04.2012
Processo: Ag 1368507