ADVOCACIA – o que aconteceu?
João Manuel de Sousa Saraiva[1]
Formado há mais de vinte anos abracei a advocacia com uma verdadeira paixão que, com o passar dos anos, vem se tornando morna, rotineira e monótona, fazendo parecer um dos reais casos de separação judicial pelos quais já pude atuar.
Olho para trás e percebo que a advocacia perdeu ou perde paulatinamente seu charme e vai se corroendo diante dos grandes interesses econômicos e pessoais que permeiam as demandas. Já ficaram no tempo as caravanas de estudantes que acompanhavam os grandes advogados em audiências no interior somente para ver o brilhantismo de uma sustentação oral (em especial no Tribunal do Júri).
E o pior. Hoje vemos disseminado em nosso meio o grave problema do lobby que retira do advogado a chance de, com seu conhecimento e – perdoem-me – malícia jurídicos, conduzir o processo. Vale a máxima de que “melhor do que um bom advogado é um advogado[2] que conhece o juiz[3]”. Uma pena pois isto representa o fim do romantismo da profissão.
Sobrecarregado com a responsabilidade que lhe é imposta pelo próprio munus, o advogado ainda vê reproduzirem com uma invejável fertilidade faculdades de esquina, onde cada vez mais profissionais despreparados e baratos são colocados no mercado, o que trás por conseqüência uma verdadeira e desleal guerra por clientes.
E uma triste constatação: hoje os já difíceis clientes barganham por preço sob a constante e real ameaça de que “ – o amigo do filho do vizinho do padeiro é advogado e realiza o mesmo trabalho por um terço do preço!!!”. É de fácil conclusão que os advogados viraram verdadeiros pigmeus jurídicos, devorando-se uns aos outros como única regra de sobrevivência na selva jurisdicional.
Bem, some-se a tudo isto a morosidade da Justiça que, injusta e gratuitamente, sempre é creditada a nossa classe profissional, assim como a ótima fama moral que nos acompanha. Quem será que nunca ouviu os imaginativos adjetivos qualificativos impostos aos advogados.
Neste sentido vejo e ouço muitas reclamações de colegas de profissão, mas raros são os que demonstram preocupação com a recuperação dos princípios que devem, ou deveriam, nortear nossas ações.
Talvez, quem sabe, a advocacia deva sofrer uma reciclagem moral e ética. Não seria a hora de fazermos uma profunda reflexão sobre nossos valores e praticar uma advocacia mais técnica, mais ética e menos personificada? Não deveriam as escolas primárias relevar tais valores a seus pequenos alunos, mostrando-lhes sua importância?
Diante de tantas constatações a grande pergunta que me persegue dia e noite é simples e deveria, também, ser simples a sua por enquanto desconhecida resposta: o que aconteceu com a advocacia?
João Manuel de Sousa Saraiva
(OAB/ES 5764)
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